Rio de Janeiro, . | Economia, Governo


Não há como “dar uma pausa” na economia

Alexandre B. Cunha

Com o intuito de conter o avanço da Covid-19, diversos países adotaram a política de confinamento. Um sério problema da referida política é o seu forte impacto adverso sobre a atividade econômica. Por tal motivo, vários governos implantaram medidas de auxílio financeiro aos indivíduos e às empresas. Com isso, surgiu a crença de que seria factível pausar a economia. Se a palavra pausar estiver sendo usada no sentido usual de interromper a reprodução de um vídeo e retomá-la exatamente no ponto em que ocorreu a paralisação, então certamente isso não é possível.

Não é possível “pausar” a atividade econômica. Autor: Clker-Free-Vector-Images. Fonte: Pixabay.

A discussão sobre a “pausa” na atividade econômica aparece até mesmo em veículos especializados como The Wall Street Journal e Exame. O primeiro deles publicou uma matéria denominada Um dilema global: como pausar a economia e evitar a ruína (A Global Conundrum: How to Pause the Economy and Avoid Ruin em inglês), enquanto no segundo se encontra o texto intitulado A grande pausa. É importante ressaltar que nenhum dos dois artigos sugere explicitamente que findo o confinamento a economia retornará para a situação em ela se encontrava antes da pandemia. Todavia, o uso das expressões pausar e pausa nos títulos pode induzir um leitor a erro. Adicionalmente, diversas pessoas com que este autor recentemente conversou aparentemente acreditavam que a ação governamental faria com que, findo o confinamento, a retomada se desse a partir do patamar em que economia estava antes da eclosão da pandemia. Infelizmente, essa visão está completamente equivocada.

A interrupção da atividade econômica causada pelo confinamento tende a causar elevações no número de falências e na taxa de desemprego. Dito isto, a questão que se coloca é a seguinte: será que a ação governamental pode impedir a ocorrência desses dois fenômenos? Ou seja, será que o governo tem como “dar uma pausa” na economia? A resposta é inequivocamente negativa. Há vários motivos para tanto. Discutem-se abaixo quatro deles.

Primeiro, o mais simples de todos: o custo do socorro. Possivelmente, para salvar todas as empresas e empregos o governo precisaria de um volume de recursos que ele simplesmente não tem acesso (ainda mais em um momento de crise).

O segundo impedimento decorre do fato de que a implementação de uma “pausa” requer uma capacidade que quase certamente nenhum governo no mundo possui. Afinal de contas, para que um governo tivesse sucesso em impedir todas as possíveis falências, ele precisaria alcançar rapidamente todas as empresas afetadas. Ou seja, cada uma das empresas existentes no país precisaria receber, em um intervalo de poucos meses, um aporte de recursos públicos. Provavelmente nenhum governo do mundo tem condição de fazer isso. E muito menos o governo brasileiro, notoriamente ineficiente e burocrático.

O terceiro motivo está relacionado a uma possível falta de interesse dos gestores e/ou proprietários de algumas empresas em mantê-las em operação. A título de ilustração, suponha que o proprietário de um pequeno restaurante obtinha um lucro muito modesto antes da pandemia. Se ele acreditar que na situação pós-pandemia haverá uma queda nas vendas de forma que aquele pequeno lucro se transformará em prejuízo, então possivelmente sob o seu ponto de vista será melhor simplesmente liquidar o negócio imediatamente do que insistir em operar com perdas até que em uma data totalmente incerta a situação se reverta. Colando de outra forma, o socorro financeiro possivelmente será atraente para aqueles empresários que acreditarem que as suas empresas serão lucrativas após o confinamento. Para os demais, o interesse em receber algum auxílio será pequeno ou mesmo inexistente.

O último problema decorre das inevitáveis contradições internas das medidas de socorro. Por exemplo, o governo norte-americano elevou o valor do seguro-desemprego. Por outro lado, ele criou uma linha de auxílio para as firmas que tinha como contrapartida que a empresa interessada recontratasse quem tivesse sido demitido após o início do confinamento. Todavia, algumas pessoas que foram demitidas não quiseram retornar ao trabalho, já que valor do seguro-desemprego era superior aos salários que elas recebiam antes da pandemia.

Em síntese, o governo brasileiro não será capaz de “dar uma pausa” na economia. No máximo, ele conseguirá mitigar os efeitos adversos do confinamento sobre a atividade econômica. Ainda assim, tudo indica que este país tem pela frente aquela que talvez seja a pior recessão da sua história.


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